02/11/2007 - 17h42
Cérebro gerecia memória como o computador, diz estudo
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RAFAEL GARCIA
da Folha de S.Paulo
Um experimento que mostrou como o cérebro faz para gerenciar as memórias reforça a teoria de que o processo é semelhante ao que ocorre em um computador.
O trabalho, coordenado pelo neurocientista Sidarta Ribeiro, diretor do IINN (Instituto Internacional de Neurociências de Natal), flagrou o momento em que algumas estruturas cerebrais são ativadas para "salvar" dados.
Ribeiro, diferentemente de outros cientistas, não mostra receio em comparar mente e máquina, mas explica por quê: "É claro que não é a mesma coisa, mas é a melhor metáfora que a gente tem", diz. "O cérebro é um computador, só que é um computador construído com regras diferentes."
Uma dessas regras, porém, parece ser muito semelhante. Em 2004, Ribeiro já havia proposto juntamente com o colega Miguel Nicolelis, da Universidade Duke, nos EUA, uma teoria nesse sentido.
Segundo eles, duas estruturas cerebrais distintas --o hipocampo e o córtex-- funcionariam de maneira semelhante aos centros de memória de um computador --a memória RAM e o disco rígido.
Uma série de experimentos nos últimos quatro anos reforçou a hipótese, e em um estudo publicado nesta sexta-feira na edição de lançamento da revista "Frontiers in Neuroscience", Ribeiro e Nicolelis detalham as evidências experimentais em favor da analogia.
Memória RAM
Uma das principais pistas é que os cientistas detectaram pela primeira vez o momento em que o cérebro transfere informações do hipocampo para o córtex -como se fosse um software de edição "salvando" um texto- num breve período, de cinco a dez segundos, durante o sono.
A descoberta só foi possível porque os cientistas conseguiram analisar ao mesmo tempo a atividade elétrica dos neurônios e a ativação de genes que fazem essas células produzirem as conexões de longo prazo para as memórias duradouras.
"Foi a primeira vez que alguém fez uma combinação de duas técnicas que, em si mesmas, já são difíceis", diz.
Sono
Trabalhando com ratos que eram submetidos a experimentos de aquisição de memória, os pesquisadores conseguiram mostrar que a atividade elétrica do hipocampo induzia o córtex a ativar --algumas horas depois, durante o sono-- os genes necessários para as conexões duradouras.
De quebra, Ribeiro, Nicolelis e colegas ainda conseguiram mostrar que essas duas etapas ocorrem em fases distintas do sono.
Durante a fase chamada de sono de ondas lentas --o sono pesado-- o hipocampo (porta de entrada do aprendizado) prepara as memórias para serem enviadas ao córtex, e se manifesta por meio de atividade elétrica.
Durante o chamado sono REM (movimento rápido dos olhos, em inglês), ativa os genes que produzem as proteínas necessárias às conexões da memória de longo prazo.
"É a primeira evidência eletrofisiológica de que uma memória persiste e reverbera durante o sono no córtex e não no hipocampo", diz Ribeiro. "Durante o sono, o córtex continua "lembrando", mas o hipocampo não", explica.
Medição
A transmissão de dados de uma estrutura à outra foi detectada quando o grupo mediu a atividade elétrica dos neurônios e descobriu que em um breve momento eles entravam em sincronia, disparando impulsos na mesma freqüência.
"Há uma correlação estreita entre a amplitude das oscilações neurais nessa freqüência, de 10 a 14 hertz, e a expressão dos genes [necessários à fixação de memórias]", diz Ribeiro.
Resgatando Freud
Ao mesmo tempo em que trabalha com roedores, o cientista conduz em Natal experimentos com pessoas para tentar entender o papel dos sonhos nesse processo.
Ribeiro, um neurocientista que se interessa pela teoria da psicanálise --algo raro em seu campo de pesquisa--, diz que quer tentar "resgatar Freud no que ele tinha de mais cientifico", ou seja, tentar entender o papel dos sonhos na biologia humana.
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